O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, fez críticas contundentes à atuação da Corte no caso que investiga a suposta tentativa de golpe envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro. Durante uma entrevista concedida ao programa Ponto de Vista, da revista VEJA, o magistrado demonstrou forte preocupação com os rumos tomados pelo STF, especialmente no que diz respeito à sua competência constitucional para julgar o caso.
Segundo Marco Aurélio, o Supremo está assumindo um papel que não lhe cabe no ordenamento jurídico. Ele afirma que, por se tratar de cidadãos sem foro privilegiado, o processo deveria estar tramitando na primeira instância da Justiça, e não diretamente na Suprema Corte. “É algo que me deixa perplexo. O STF não tem competência para julgar cidadãos comuns, tampouco ex-presidentes, ex-deputados ou ex-senadores”, pontuou.
O ex-ministro fez ainda um alerta incisivo sobre o impacto dessas decisões no futuro da Corte. “A história cobrará caro esse desvio de função. O Supremo precisa ser um exemplo de respeito à Constituição, e não o contrário”, declarou.
Comparação com o caso Lula
Marco Aurélio também fez um paralelo com a condução do processo que envolveu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Operação Lava Jato. Ele lembrou que, mesmo sendo ex-presidente, Lula foi julgado inicialmente na 13ª Vara Criminal de Curitiba, e não pelo STF.
“Bolsonaro deve ser julgado pelo Supremo? Quando Lula foi processado como ex-presidente, ele foi julgado pela Suprema Corte? Claro que não. Foi julgado pela Justiça de primeira instância. Só mais tarde, o STF entendeu haver uma incompetência territorial, mas isso só ocorreu depois que os processos já estavam praticamente esvaziados, com muitas acusações prescritas”, argumentou o jurista.
Para o ex-ministro, essa diferença de tratamento entre os dois casos levanta questionamentos sobre a uniformidade da aplicação da lei e a possibilidade de haver dois pesos e duas medidas. “Mudou a legislação? Ou será que o sistema passou a agir com critérios distintos, o que é inaceitável?”, questionou.
As declarações de Marco Aurélio Mello reacendem o debate sobre os limites constitucionais do Supremo Tribunal Federal e sua atuação em casos de forte repercussão política. Para o ex-ministro, decisões como essa abrem precedentes perigosos e fragilizam a imagem institucional da Corte perante a sociedade e a história.