Nas dias, um clima de evidente desconforto tomou conta do Supremo Tribunal Federal (STF). O motivo? O avanço do projeto de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro. Com 257 assinaturas já garantidas para a urgência da proposta na Câmara, o debate deixou de ser apenas jurídico e virou um embate político e institucional de alta voltagem. E, convenhamos, o STF parece estar mais inquieto do que nunca.
A inquietação da Corte se traduz em recados enviados à imprensa, entrevistas, bastidores vazados e até perguntas sugeridas por ministros a jornalistas em rede nacional. A cena da comentarista da GloboNews, Eliane Cantanhêde, lendo ao vivo uma pergunta redigida por um ministro do STF sobre o caso é, no mínimo, inusitada — e revela muito mais do que parece à primeira vista. O STF passou a usar os microfones da mídia como sua extensão institucional informal, pressionando o Legislativo a não levar a anistia adiante.
Mas será que essa reação exacerbada não denuncia justamente o que querem esconder? O medo de que se reconheça, mesmo que indiretamente, que houve excessos nas condenações? A própria admissão de “revisão de penas” ou “progressão de regime” para alguns presos do 8 de janeiro é um recuo camuflado. Afinal, se tudo foi tão dentro da lei, por que a súbita boa vontade?
A resposta pode estar no peso de uma história recente. O mesmo STF que hoje se revolta com a ideia de anistiar cidadãos comuns que, em sua maioria, cometeram crimes de menor potencial ofensivo ou sequer tiveram provas contundentes contra si, foi o mesmo que rasgou a Lava Jato e promoveu a libertação de corruptos históricos envolvidos no maior escândalo de corrupção da história do país, o Petrolão. Não é exagero dizer que figuras centrais desse esquema voltaram à cena política com as bênçãos do mesmo tribunal que agora se diz preocupado com a impunidade.
Dois pesos, duas medidas. Essa é a percepção de boa parte da sociedade — especialmente da parcela que apoia a anistia. Não se trata de defender o caos, a baderna ou a impunidade, mas sim de reconhecer que justiça sem equilíbrio vira perseguição. O que vimos com muitos dos réus do 8 de janeiro foi uma máquina de moer reputações, um processo judicial com cara de vingança institucional, e penas que destoam do razoável.
Ao transformar cidadãos em símbolos para dar um recado político, o STF ultrapassou limites e agora tenta contornar os próprios excessos com discursos indiretos e concessões tímidas. Mas a população não é boba. Viu a injustiça, sentiu o peso do autoritarismo judicial e agora reage através do instrumento legítimo do processo legislativo: um projeto de anistia.
É hora de colocar o dedo na ferida. O STF precisa entender que o papel de um tribunal é aplicar a lei com justiça, e não com emoção, vingança ou interesses políticos. O Brasil não precisa de deuses do Olimpo, mas de ministros que respeitem a Constituição e aceitem que errar também faz parte do jogo democrático.
A anistia, gostem ou não os togados, é um instrumento legal e legítimo. Negá-la com base em orgulho ferido ou em recados cifrados à imprensa não fortalece a democracia — a enfraquece.