É até compreensível quando pessoas humildes, sem acesso à informação de qualidade, acabam se confundindo com a propaganda política e defendendo narrativas que não resistem ao menor aprofundamento. O que realmente nos choca é ver o silêncio — ou pior, a defesa — de homens e mulheres esclarecidos, formados, com títulos acadêmicos, que acompanham o noticiário, leem investigações e têm pleno conhecimento dos fatos.
Por que tantos intelectuais, jornalistas, professores e advogados continuam ignorando ou justificando os escândalos de corrupção que marcaram a história recente do Brasil?
Não estamos falando de suposições. Estamos falando de fatos já julgados e documentados por instâncias superiores do Judiciário, por investigações da Polícia Federal, por denúncias do Ministério Público Federal e por decisões de juízes de direito. Casos como o mensalão, o petrolão e as operações da Lava Jato não são invenções de redes sociais — foram capítulos reais, vergonhosos e traumáticos da política nacional.
O mensalão, julgado pelo Supremo Tribunal Federal, foi um dos maiores esquemas de compra de apoio político do Congresso Nacional. O operador do esquema, Marcos Valério, declarou formalmente ao Ministério Público que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha pleno conhecimento do que acontecia. E foi além: afirmou que Lula estaria ligado aos bastidores da morte de Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André, assassinato até hoje mal explicado e cheio de contradições.
Em outro momento da história, veio à tona o petrolão, esquema de corrupção bilionário envolvendo Petrobras, empreiteiras como Odebrecht e OAS, e políticos de diversos partidos, com forte protagonismo do PT. A Operação Lava Jato, que desvendou essa teia de corrupção, foi reconhecida mundialmente. De acordo com dados do Ministério Público Federal, foram recuperados mais de R$ 42 bilhões desviados dos cofres públicos.
Lula, ex-presidente, foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A sentença foi proferida pelo então juiz Sérgio Moro e confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça. O Supremo Tribunal Federal, anos depois, anulou as condenações por questões processuais, alegando que a vara de Curitiba não era competente para julgar os casos — mas em nenhum momento declarou inocência de mérito.
Como bem destacou o jurista Modesto Carvalhosa, “não é porque uma sentença é anulada por questões técnicas que os crimes deixam de existir.” A corrupção, os acordos ilícitos, os favorecimentos e os desvios ficaram comprovados por delações, documentos, registros de propinas e até por sistemas de contabilidade paralela, como o da Odebrecht.
Além disso, reportagens investigativas, como as publicadas por Leonardo Coutinho, revelaram relações perigosas entre membros do partido e facções criminosas, como o PCC e o Comando Vermelho, algo gravíssimo e que deveria mobilizar a consciência de qualquer cidadão de bem.
Então, por que o silêncio de tantos intelectuais diante de tudo isso?
Será ideologia? Orgulho? Conveniência? Ou será medo de reconhecer que confiaram demais em um projeto que se revelou podre por dentro?
A omissão, quando vem de quem sabe, é ainda mais grave do que a ignorância. E como disse certa vez o promotor Deltan Dallagnol, “o maior desafio da justiça no Brasil não é punir os corruptos, mas vencer a cultura de proteção e idolatria a eles.”
Ninguém está livre de erro, mas persistir no erro — especialmente quando se tem acesso à verdade — é escolha.
O Brasil precisa de lucidez. Precisa de gente corajosa o suficiente para fazer autocrítica, para reconhecer que foi enganada, e para dizer: “basta.” A verdade pode incomodar, mas é ela que liberta.
Pastor Luciano Gomes, teólogo