Mercenários no aprisco: Quando o ladrão usa paletó e carrega uma bíblia.

“O ladrão não vem senão a roubar, a matar e a destruir; eu vim para que tenham vida, e a tenham com abundância.”

(João 10:10)

O capítulo 10 do evangelho de João é um verdadeiro raio-x espiritual da liderança religiosa de ontem e de hoje. Infelizmente, muitos leem João 10:10 isoladamente e atribuem de imediato a figura do ladrão ao diabo. Mas ao olhar com atenção para o contexto bíblico, especialmente a partir do capítulo 9, percebemos que Jesus não estava falando do diabo, mas sim dos fariseus – líderes religiosos da época, que rejeitaram o cego curado e questionaram a autoridade de Cristo. Eles se achavam donos do aprisco, mas não passavam de usurpadores.

Jesus, então, usa uma parábola pastoral, recheada de símbolos que os ouvintes daquela época conheciam bem: o aprisco, o pastor, as ovelhas, o porteiro, o lobo, o ladrão… e o mercenário.

Ele começa dizendo que quem não entra pela porta é ladrão e salteador. Em outras palavras, quem tenta liderar o rebanho sem passar por Cristo – a Porta – é um impostor. O verdadeiro pastor entra pela porta, chama as ovelhas pelo nome, caminha com elas e dá a vida por elas. Já o ladrão, o estranho, o mercenário… esses só têm um interesse: o lucro.

A imagem do mercenário é especialmente dolorosa. Ele até parece pastor, mas no fundo está apenas interessado no benefício próprio. Quando vê o lobo, foge. Ele não ama as ovelhas, não tem compromisso com a dor do rebanho, não se envolve com as suas lágrimas.

E hoje, como isso se aplica?

Vivemos dias muito semelhantes àqueles de João 10. Há sim, graças a Deus, pastores fiéis, homens e mulheres de Deus que estão cuidando das feridas das ovelhas, servindo no anonimato, investindo suas vidas na obra missionária, acolhendo viciados, evangelizando comunidades, orando por famílias em crise. Pastores que cheiram a ovelha e não a perfume importado. Que choram junto com o rebanho e se alegram com as pequenas conquistas de cada um.

Por outro lado, o cenário evangélico está infestado de mercenários travestidos de pastores. Gente que vê a igreja como uma empresa, o púlpito como palanque, e o rebanho como degraus para fama e poder. São “pastores” que vivem mais em aeroportos do que entre as ovelhas, que têm tempo para lives e congressos, mas não para uma visita no hospital ou uma oração no presídio.

Enquanto as ovelhas sofrem, muitos desses líderes estão preocupados com curtidas, seguidores, cachês e agendas lotadas. Trocaram a cruz pelo status, a compaixão pela autopromoção, o altar pela vitrine.

Será que Jesus não estava falando exatamente disso?

“O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas” (João 10:11). Isso é mais do que uma frase bonita. É uma vocação. É um chamado. É uma cruz que se carrega todos os dias. E não é para qualquer um. É para quem foi chamado pela Porta. Quem entrou por outro caminho não é pastor… é ladrão.

Pastor de verdade não foge do lobo. Ele enfrenta. Ele protege. Ele socorre. Pastor de verdade não marca horário para atender a ovelha ferida. Ele se dispõe, mesmo cansado, mesmo sem receber aplausos. Pastor de verdade não se deslumbra com os templos, mas com a transformação de vidas.

Meu irmão, minha irmã, cuidado com a voz do estranho. O texto é claro: “as ovelhas não seguem o estranho, antes fogem dele” (João 10:5). Se você é ovelha do Bom Pastor, sua alma vai discernir a diferença. Jesus é a Porta. Nele encontramos salvação, abrigo, provisão e cuidado.

E a você, que também serve no ministério, deixo uma pergunta de Jesus, para reflexão:

“Amas-me? Apascenta as minhas ovelhas.” (João 21:17)

Não sejamos mercenários. Sejamos pastores segundo o coração de Deus.

Pastor Luciano Gomes, teólogo